Costumava gostar de você
Forte
Prolongado
Leve
Breve
Do jeito que fosse
Eu não pedia muito
Eu só queria senti-lo em mim
Chamava
Nunca vinha
Eu era inteira, mas eu queria aquele sopro
Que me chacoalhasse
E tirasse a poeira
Faltava o sopro,
Sopro que viesse,
Que mostrasse ao mundo para que as cortinas servem
Acostumei-me a ser cortina
- Não de verdade -
Mas cortina de enfeite
Enfeitava sua janela
Enquanto você tirava férias
Ansiosa,
Estática
Perdi a conta:
Foram dias
Tardes
Noites
Vendo através das janelas
Nosso velho jardim
- hoje mato esturricado
terreno abandonado
deserto
semi-árido sem fim-
Ainda não entendo:
Você me escolheu
Dependurou-me
Disse que seria cortina
Que era pra embelezar a casa
Depois calou-se
Tirou férias,
Partiu
O destino? Malibu
Malibu deve ser mesmo linda
De certo, envolvente
Maldita seja
Maldita Malibu
Fiquei triste
Adoeci tentando entender
Você dizia que eu era linda
E que estava feliz com o nosso jardim
Mentiroso
Mascarou a verdade
Mentiu
Não me disse
Por que não contou?
Que minha função era não ser nada?
As férias acabaram
Aguentei firme
Da maneira que pude
Mais dias
Meses
Um
Dois
Três anos
Férias prolongadas
Eu perdoei-te,
O tempo todo
Você brincou comigo,
Mas com o tempo não se brinca,
Ele não perdoa:
Fez ao suporte o que faz com os ossos
E às argolas o que faz aos dentes
Hoje sou o que restou
Autodeclarada sobrevivente
Argola presa à madeira podre,
Que já não segura os panos direito
Houve um tempo
Em que busquei válvulas de escape
Hoje agarro-me na esperança de encontrar
Alguém
Algum ser empático
Que se interesse em ajudar-me a fazer
O que já não consigo sozinha
Alguém que ofereça reparo
A essa destruição que sofrem os seres trocados
Abandonados
Deixados sozinhos
Sem qualquer motivo
Giovana da Rocha
Giovana da Rocha
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